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1 Agosto 2018 | Vista 3483 vezes |

ANGOLA: CAMINHANDO JUNTOS


O Instituto Pedro Pires para a Liderança (IPP) tem como uma das suas principais estratégias alargar os seus horizontes e poder também actuar nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa. Com esse propósito, assinou, recentemente, um protocolo com a Academia BAI de Angola, por ocasião da realização do seu V Diálogo Estratégico (V DE), em Maio último, evento que trouxe a Cabo Verde a Primeira Dama de Angola, Ana Dias Lourenço. No rescaldo do V DE, e para melhor dar a conhecer o IPP ao público angolano e não só, a Directora Executiva do IPP, Indira Pires, concedeu uma entrevista ao Novo Jornal de Angola, que reproduzimos aqui.

Boa leitura!

Pode-nos dizer, em traços gerais, quais os pressupostos que levaram à criação destes “Diálogos Estratégicos”?

O Diálogo Estratégico (DE) surgiu com o propósito de criar um espaço para o diálogo de alto nível e para a reflexão sobre questões de importância crítica para Cabo Verde, para a África e para o Mundo. Um espaço criado pela sociedade civil para a sociedade civil, numa perspectiva de procurar mudar a narrativa africana em Cabo Verde, trazendo o continente a estas ilhas. É uma contribuição do IPP para a promoção de um espaço descomplexado de troca de opiniões sobre os desafios e as oportunidades que a promoção de uma postura mais justa relativamente a questões de interesse poderá significar para a consolidação e reforço da democracia, para o desenvolvimento dos países e para o fortalecimento do exercício da cidadania, melhorando, em última instância, a qualidade de vida dos cidadãos. Espera-se, ainda, que os debates realizados no âmbito dos Diálogos Estratégico do IPP permitam abordar experiências adoptadas em outras realidades, que possam, eventualmente, servir de exemplo e de inspiração ao caso cabo-verdiano e que o caso cabo-verdiano possa também inspirar outros realidades. Assim, o IPP almeja, essencialmente, promover um espaço de debate aberto e participado, que possa contribuir para informar e enformar políticas públicas, mas também para influenciar comportamentos e atitudes que confluam para que se atinja um desenvolvimento cada vez mais justo, solidário e responsável, verdadeiramente inclusivo e que represente oportunidades para todos.

Conhecendo a figura e o percurso desse extraordinário combatente que é Pedro Pires, é fácil verificar que há uma continuidade lógica das suas preocupações, no que diz respeito fundamentalmente ao desenvolvimento humano. Podia-nos fazer uma breve abordagem sobre os primeiros quatro encontros?

O primeiro DE aconteceu em 2014, por altura dos 80 anos do patrono do IPP. e decidiu-se, assim, celebrar e homenagear a vida e obra do seu fundador com a realização do primeiro DE sobre “Cidadania e Integração regional”, onde tivemos a presença de personalidades como o Presidente Thabo Mbeki (África do Sul), Oscar Oramas (Cuba), o falecido Almeida Santos (Portugal), Mo Ibrahim (Sudão); Landim Savagne (Senegal), Lopo Nascimento (Angola), entre outras personalidades nacionais. O I DE teve como pretensão explorar a integração regional numa perspectiva cidadã e de consciência social, tendo como principal objectivo debater o papel que o cidadão deve assumir para que a integração regional represente uma mais-valia para o país e não um factor de desequilíbrio social. Desde então, o IPP tem vindo a realizar anualmente, em Maio, os seus DEs. No II DE, em 2015,ano em que Cabo Verde completou 40 anos de independência, com a preocupação de levar em conta todo o processo de desenvolvimento do país, as fases e o percurso de um país jovem como Cabo Verde, o IPP decidiu trazer a debate dois conceitos importantes: inovação e desenvolvimento. A ideia foi promover um debate mais consequente, que abordasse a inovação não como um fim em si, mas como um meio para que se atinja o fim maior: um desenvolvimento justo, inclusivo e com oportunidades para todos. E assim o Instituto realizou o seu II Diálogo Estratégico tendo como tema central “Inovação na gestão do desenvolvimento”, com oradores e painelistas como Domingos Simões Pereira (Guiné-Bissau), Boaventura de Sousa Santos (Portugal), Senador Cristovam Buarque (Brasil), Óscar Monteiro (Moçambique), entre outras personalidades caboverdianas. Em 2016, o IPP trouxe a debate “Que capital humano, para que desenvolvimento?”, tendo em conta a inadiável necessidade de imprimir maior qualidade ao sistema educativo como um todo e de adequar as metodologias de ensino às reais necessidades de desenvolvimento de Cabo Verde, respondendo ao imperativo de as tornar mais relevantes e consequentes e de tornar o país mais competitivo, no contexto de uma economia globalizada. Assim, trouxemos oradores do Brasil (Ricardo Paes de Barros), do Gana, (Fred Swaniker) e da nossa diáspora ( Bob Barboza), para além de oradores nacionais. No ano passado, em 2017, o poder e o papel influenciador dos meios de comunicação social, assim como os reflexos que essa influência pode ter sobre a liberdade democrática, foram assuntos debatidos no IV DE, tendo como tema central “Democracia e Imprensa Livre”. Destaco oradores como Celso Amorim do Brasil, Filipe Correia de Sá de Angola e Abdoulaye Bathily do Senegal.

Este “Diálogo”, o quinto, esteve essencialmente virado para a problemática das “Mulheres e da Liderança”. Foi conseguido o objectivo pretendido, enunciado por vós, quando, no sub-título, assinalam a necessidade de se fugir aos chavões?

Acreditamos que sim. O objectivo foi alcançado principalmente pela diversidade das ideias partilhadas e dos perfis dos oradores. De Angola, tivemos, por exemplo, a Primeira Dama de Angola, Dra. Ana Dias Lourenço, como keynote speaker do V DE, responsável pela conferência motivacional, e a Dra. Noelma Viegas D’Abreu, que participou num painel intitulado “Vamos falar sobre feminismo, igualdade, maternidade e participação cívica?”. Tendo em conta que a temática que escolhemos para este ano costuma provocar debates acesos- por vários factores que influenciam as tomadas de posição relativamente a esta questão, desde emocionais, culturais, sociais, religiosos e económicos -, procurou-se discutir a mulher enquanto indivíduo com direitos, escolhas e anseios relacionados tanto com o seu corpo como com a sua vida familiar, profissional e cívica. Mas também a igualdade de género, enquanto promoção de uma economia inteligente, que contribui para o aumento da produtividade e para a melhoria dos resultados do desenvolvimento, incluindo perspectivas para a próxima geração e para a qualidade das políticas e das instituições da sociedade. Assim, e na medida em que o DE tenta promover um espaço de debate descomplexado de ideias, sem julgamentos, a audiência teve oportunidade de ouvir e de se pronunciar sobre questões como a maternidade, o feminismo e o “tecto de vidro”, apenas para mencionar alguns aspectos levantados no V Diálogo. Por exemplo, alguns declararam-se feministas, outros não e outros, ainda, humanistas. Portanto, foi um espaço de partilha, de aprendizagem e de respeito por opiniões e visões contrárias.

Que participações tiveram e em que medida esta iniciativa pode vir a ser alargada aos restantes Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa?

O IPP procura com os DEs, como já mencionei acima, trazer a Cabo Verde oradores de várias latitudes, mas particularmente de países africanos, com o propósito de inovarmos tanto nas narrativas como nas perspectivas de cooperação e de parceria. Vemos os DE como uma forma da sociedade civil africana se conhecer e procurar cooperar entre si, a fim de criar laços, de estreitar laços já existentes e de promover, assim, uma verdadeira integração africana - mutuamente vantajosa - por via dos cidadãos e das suas iniciativas profissionais ou outras. Para além dos PALOP, procuramos trabalhar com a nossa diáspora, tentando dar a conhecer as estórias de sucesso de cabo-verdianos na diáspora mas também ver de que forma essa diáspora poderá colaborar com Cabo Verde. Concretamente, sobre a possibilidade de vir a alargar esta iniciativa a outros Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, devo dizer que estamos a trabalhar essa possibilidade com um dos nossos parceiros institucionais em Angola, a Academia BAI, no sentido de realizar, já no próximo ano, o VI DE em Luanda. Estamos muito entusiasmados com esta parceria e encaramo-la como uma responsabilidade acrescida e um desafio que abraçamos com grande motivação.

Nos nossos países, os Direitos das Mulheres, acabaram, via de regra, por assistir a algum retrocesso, fruto de alguma pressão de instituições mais conservadoras, como as Igrejas. Como encara as formas de abordar um problema que é grave e que necessita, com alguma premência, de ter uma nova abordagem, para que a Mulher reocupe o lugar que é seu, de pleno direito, nas nossas sociedades?

Quanto a outras realidades africanas, não conheço suficientemente a fundo a situação das mulheres e, por isso, prefiro não comentar. Mas relativamente a Cabo Verde, acredito que estamos a caminhar. Há sinais, tanto da sociedade civil como do governo, de procura de soluções que protejam as mulheres em casos de violência doméstica, por exemplo, mas também que permitam e estimulem a sua participação na vida política do país. Aliás,prevê-se ainda para este ano a discussão da lei da paridade. Mesmo assim, em Cabo Verde, e acredito que na maioria dos países africanos, a pobreza tem cara feminina e o desemprego é seixista, ou seja, as mulheres representam a maioria dos desempregados e também a maioria da população mais pobre. Por outro lado, ainda não existem políticas financeiras, por exemplo a nível fiscal, de promoção económica que respondam aos desafios enfrentados pelas mulheres em Cabo Verde. Portanto, penso que, embora já tenham sido dados passos importantes no sentido da promoção dos direitos das mulheres em Cabo Verde, temos ainda um caminho a percorrer, principalmente no que diz respeito a conseguir espelhar nas nossas atitudes e práticas aquilo que já está consagrado a nível legislativo.

Acreditamos que já estejam a pensar no sexto “Diálogo Estratégico”. Já têm algum tema escolhido?

Já estamos a pensar nisso, mas ainda não temos nada definido. O mais importante é conseguir promover um verdadeiro Diálogo, portanto, terá que ser uma temática de interesse para Angola. Terá também que possibilitar trazer oradores de outras realidades, principalmente de países africanos, para darem o seu contributo ao debate, procurando debater as melhores soluções para os desafios dos nossos países. Soluções inovadoras e eficientes, mas sempre contextualizadas às nossas realidades, no entendimento de que as melhores soluções serão sempre locais.

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